sexta-feira, 12 de agosto de 2011

POESIA MATEMÁTICA - Millôr Fernandes


            As folhas tantas do livro matemático, um Quociente apaixonou-se um dia doidamente por uma Incógnita.
Olhou-a com o seu olhar inumerável e via-a do ápice à base; uma figura impar; olhos rombóides, boca trapezóide, corpo retangular, seios esferóides.
Fez da sua uma vida paralela a dela, ate que se encontraram no infinito.
“Quem és tu?” - indagou ele em ânsia radical.
“Sou a soma dos quadrados dos catetos. Mas pode me chamar de Hipotenusa”.
E de falarem descobriram que eram (o que em aritmética corresponde a almas irmãs) primos entre si.
E assim se amaram ao quadrado da velocidade da luz numa sexta potenciação traçando, ao sabor do momento e da paixão, retas curvas, círculos e linhas senoidais nos jardins da quarta dimensão.
Escandalizaram os ortodoxos das formulas euclidianas e os exegetas do universo finito.
Romperam convenções newtonianas e pitagóricas.
E enfim resolveram se casar, constituir um lar, mais que um lar, um perpendicular.
Convidaram para padrinhos o Polígono e a Bissetriz.
E fizeram planos e equações e diagramas para o futuro, sonhando com a felicidade integral e diferencial.
E se casaram e tiveram uma secante e três cones muito engraçadinhos
E foram felizes Ate aquele dia em que tudo vira afinal monotonia.
Foi então que surgiu o Maximo Divisor Comum, freqüentador de círculos concêntricos viciosos.
Ofereceu-lhe, a ela, uma grandeza absoluta, e reduziu-a a um denominador comum.
Ele, Quociente, percebeu que com ela não formava mais um todo, uma unidade.
Era um triângulo tanto chamado amoroso.
Desse problema ela era uma fração a mais ordinária.
Mas foi então que Einstein descobriu a relatividade e tudo o que era espúrio passou a ser moralidade, como alias em qualquer sociedade.

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